Um dia, gastos, voltaremos
A viver livres como os animais
E mesmo tão cansados floriremos
Irmãos vivos do mar e dos pinhais.
O vento levará os mil cansaços
Dos gestos agitados irreais
E há-de voltar aos nosso membros lassos
A leve rapidez dos animais.
Só então poderemos caminhar
Através do mistério que se embala
No verde dos pinhais na voz do mar
E em nós germinará a sua fala.
Sophia de Mello Breyner
"Chamo-Te"
Chamo-Te porque tudo está ainda no princípio
E suportar é o tempo mais comprido.
Peço-Te que venhas e me dês a liberdade,
Que um só de Teus olhares me purifique e acabe.
Há muitas coisas que não quero ver.
Peço-Te que sejas o presente.
Peço-Te que inundes tudo.
E que o Teu reino antes do tempo venha
E se derrame sobre a Terra
Em Primavera feroz precipitado.
(Sophia de Mello Breyner)
“Nunca Mais”
Nunca mais
Caminharás nos caminhos naturais.
Nunca mais te poderás sentir
Invulnerável, real e densa -
Para sempre está perdido
O que mais do que tudo procuraste
A plenitude de cada presença.
E será sempre o mesmo sonho, a mesma ausência.
(Sophia de Mello Breyner)
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